quarta-feira, 27 de abril de 2011

Muito prazer, eu sou a culpa

Assim que uma pessoa tem filhos, é imediatamente apresentada a um novo sentimento: a culpa. Tudo bem, não é exatamente novo, provavelmente já o sentimos em vários outros momentos de nossas vidas. Mas certamente a culpa nunca apareceu com tanta intensidade, frequência, ou por razões aparentemente tão pequenas e inexplicáveis.
Culpa porque seu bebê fez cocô e você percebeu apenas depois de algum tempo. Culpa porque acidentalmente arranhou seu bebê enquanto o trocava. Culpa porque precisa deixar seu bebê chorando enquanto toma banho, faz almoço, ou qualquer outra coisa que não possa fazer com ele no colo. Culpa porque não conseguiu amamentá-lo com leite materno. Culpa por ter que levá-lo para tomar as vacinas, mesmo sabendo que a longo prazo trará apenas benefícios ao bebê. Culpa porque não passa tanto tempo por dia brincando com o bebê como acha que deveria. Culpa porque a fralda vazou durante a noite e ele passou algumas horas com a roupa molhada. Culpa porque você colocou roupas demais (ou de menos) no bebê e agora ele está passando calor (ou frio). Culpa por amaldiçoar o dia em que decidiu engravidar, o que costuma acontecer naquelas noites em que seu bebê decide acordar às 3 da madrugada e não dormir mais. Culpa porque se irritou com o bebê durante aquela crise interminável de choro. Culpa porque ele está com dor de ouvido (já que o deixou no vento durante dois segundos enquanto tentava abrir a porta do carro e segurar a coberta ao mesmo tempo). Culpa porque ele está com prisão de ventre... (você pode aproveitar as reticências e completar o texto com culpas de sua própria experiência).
Além disso, não podemos deixar de mencionar outras culpas que não estão diretamente relacionadas ao bebê, mas que surgiram a partir do momento em que ele nasceu.
Culpa por estar descuidada de sua aparência, o que inclui unhas, depilação e cabelos sempre por fazer. Culpa por manter contato com seus amigos com menos freqüência. Culpa por quase nunca ter tempo e disposição para dar atenção ao marido. Culpa por sentir-se menos produtiva no trabalho. Culpa por não conseguir manter a casa tão organizada quanto costumava. Culpa por não poder dedicar-se tanto ao restante da família. Culpa por ainda não haver perdido o peso que ganhou durante a gravidez. Culpa. Culpa. Culpa.
           Qual será o motivo que faz com que as mães vivenciem tal sentimento tão intensa e frequentemente? Tenho uma teoria: “A Síndrome da Mulher Maravilha”. Esta síndrome nos acomete ainda antes de sermos mães, mas certamente se intensifica muito com a maternidade. Ela consiste na obrigação permanente que sentimos de desempenhar todas as ações de nossas vidas com a máxima perfeição. Falei difícil? Traduzindo: QUEREMOS SER PERFEITAS EM TUDO O QUE FAZEMOS! E nem preciso dizer o quão impossível é isto.
A verdade é que precisamos desempenhar inúmeros papéis: mãe, esposa, amante, dona de casa, cozinheira, profissional, filha, irmã, amiga, mulher, entre muitos outros. A sociedade exige que desempenhemos todos eles com a máxima perfeição, com um sorriso no rosto e de preferência com unhas e maquiagem sempre feitas. E a pressão aumenta ainda mais quando aquela atriz famosa aparece na televisão três meses depois de ter um bebê e ela está radiante, com o corpo perfeito e faz questão de dizer o quanto sua vida sexual e amorosa está ainda melhor do que antes. Será verdade? Pode até ser em partes, mas não devemos esquecer da equipe de babás, domésticas, esteticistas e profissionais de saúde que assessoram esta mãe, além da pressão que ela sofre de mostrar ao público apenas o lado bom e as vantagens da maternidade. Ninguém quer ver aquela cantora famosa falando na televisão o quanto sua vida sexual piorou depois do nascimento do bebê.
              A pergunta que toda mãe deve fazer a si mesma é: fiz o melhor que pude, considerando todas as circunstâncias? Dispensei os melhores cuidados que pude ao meu bebê, considerando que não tenho babá, empregada, e preciso trabalhar fora? Dediquei o máximo de atenção que pude ao meu marido, familiares e amigos, considerando o quanto meu tempo ficou reduzido após o nasicmento de meu filho? Estou cuidando de mim mesma o máximo que posso, considerando a atual redução de tempo e dinheiro disponíveis? Se a resposta a tais questões for não, analise (sem neuras) o que pode fazer para reverter o quadro (ATENÇÃO: eu disse o que PODE fazer, ou seja, o que está ao seu alcance e não o que é impossível). Se a resposta for sim, ótimo! Você está fazendo o melhor que pode e precisa mandar a culpa para bem longe, pela felicidade de sua família e por sua própria sanidade mental. Lembre-se que a primeira pessoa que deve se convencer de que não precisa fazer tudo com perfeição é você mesma; só assim as demais pessoas serão capazes de se conscientizar do mesmo.



domingo, 10 de abril de 2011

Carta de um bebê que não foi amamentado


Enfim eu nasci. Confesso que não foi uma experiência muito agradável, tive que sair do meu cantinho quente, escuro e confortável. Mas é inevitável, certo? Tenho que encarar o mundão aqui fora...
Os primeiros dias não foram fáceis! Eu achava tudo muito estranho: as luzes, as cores, os sons, o frio, tudo! Mas o mais difícil de aguentar era aquela dorzinha incessante que em sentia na minha barriguinha. Aos poucos fui entendendo que ela se chama fome.
A mamãe bem que tentou fazer a dorzinha passar, mas foi complicado. Primeiro eu é que não sabia mamar; ela colocava o porta-mamá dela na minha boquinha (acho que chamam aquilo de seio), mas eu não sabia direito o que fazer. Notei que a mamãe ficava muito nervosa com isso, mas eu realmente não sabia o que fazer! A dor na minha barriguinha ia aumentando, a mamãe chorava de um lado e eu chorava do outro.
Depois de uns dois dias eu pensei: “Já sei! Acho que se eu der umas sugadas neste porta-mamá essa dor vai passar. Deve ser por isso que a mamãe coloca ele na minha boca”.  E foi o que eu fiz. E não é que funcionou? Quanto mais eu sugava, mais saía de lá aquele líquido quentinho e docinho, e que aliviava bastante aquela dor. Mas tinha um problema: mesmo depois de sugar um tempão (ouvi a mamãe dizendo que eu ficava mamando 20, 30 minutos), a dor não ia totalmente embora. Ela aliviava, mas não passava, e o pior, voltava rapidinho com toda a força. Eu não tinha outra opção além de chorar, chorar e chorar. A mamãe e o papai já estavam cansados, pois eu não os deixava dormir direito. Mas a fome era muito grande!
Depois de alguns dias, fomos num tal de pediatra (depois fiquei sabendo que esse cara vai cuidar da minha saúde enquanto eu for criança), e a mamãe contou toda a situação para ele. Ele deu um remedinho para a mamãe tomar, para ela ter mais leite (que é o tal líquido quentinho e docinho que eu falei). A mamãe tomou o remedinho e fez várias outras coisas que ensinaram a ela; mas nada adiantou, minha barriguinha continuava doendo, doendo, e eu chorando, chorando. Quando pensei que as coisas não podiam ficar piores, o tal do leite que já era pouco começou a diminuir cada vez mais, acreditam? Eu sugava, sugava, e saía cada vez menos do porta-mamá. E o pior é que a mamãe demorou uns dias para perceber o que estava acontecendo, tive que chorar muito!Mas uma dia ela percebeu e ligou para o tal do pediatra para explicar a situação e perguntar o que fazer. Não ouvi o que ele disse, mas fiquei observando o que a mamãe fez: ela pegou uma garrafinha com uns desenhos legaizinhos, pegou uma coisa branca de dentro de uma lata, colocou na garrafinha, colocou água e chacoalhou. Depois colocou na garrafinha uma tampinha bem parecida com a do meu porta-mamá e a colocou na minha boca. De repente eu percebi: esse é outro porta-mamá! A diferença é que ele tem muuuuito mais do tal leite. A dorzinha na minha barriga sumiu! Às vezes ela volta, mas é só a mamãe me trazer esse porta-mamá novo (descobri que se chama mamadeira) que ela passa.
Só tem uma coisa que me deixa triste. Vejo muitas pessoas criticando minha mamãe porque ela me dá a tal da mamadeira e não o tal do seio. Esses dias ouvi falarem na televisão que amamentar no seio é um ato de amor. Pode até ser, mas preciso dizer algumas coisas para quem acha que amamentar na mamadeira não é amor...
Vejo o papai e a mamãe deixando de comprar várias coisas para eles para poderem comprar para mim um leite em pó (que é aquela coisa branca que vi a mamãe tirando da lata) de boa qualidade, além de mamadeiras bem bonitas com desenhos legais. Se isto não é amor, então não sei o que é!
O papai e a mamãe levantam de madrugada e vão até a cozinha fazer minha mamadeira toda vez que eu tenho fome, mesmo que eles estejam muito cansados ou que esteja muito frio. Se isto não é amor, então não sei o que é.
Quando o papai e a mamãe me dão mamá, eles sentam no sofá bem grudadinhos comigo e a gente fica se olhando nos olhos enquanto o tal do leite faz a dor na minha barriguinha passar. Se isto não é amor, então não sei o que é. Aliás, uma das coisas legais da mamadeira é essa; meu papaizão que eu adoro também pode me alimentar!
Além disso, percebi que tem várias outras formas de amar além da amamentação, e o papai e a mamãe fazem todas elas: eles me beijam e me abraçam toda hora (às vezes até me irrita um pouco, mas eu sei que a intenção é boa). Eles ficam empolgados com qualquer coisa que eu faço, até quando abro a boca para bocejar. Parecem uns bobos. Todo mês eles me levam no tal do pediatra e também para tomar as tais vacinas; tudo bem que eu não gosto muito dessa última parte, mas eu sei que é para o meu bem. Eles me dão banho gostoso todos os dias. Eles me pegam no colo e me consolam quando estou triste, bravo, ou qualquer coisa assim. Eles brincam comigo e me fazem morrer de rir. Eles me protegem com um cobertor quentinho quando está frio. Eles não me deixam perto de pessoas doentes. Eles só deixam pessoas conhecidas e de confiança cuidarem de mim. Nossa, se eu fosse falar todas as coisas que o papai e a mamãe fazem que mostram o quanto eles me amam, isso aqui nunca mais acabava.
Para terminar, o que eu quero dizer com tudo isto é: se eu que sou pequeninho percebi que não amamentar não diminui em nada o amor que a mamãe tem por mim, acho que quem é grande também pode perceber, não é? Só sei que sou um bebê muito feliz, mamando em qualquer porta-mamá!